Os sons do silêncio

Olá, hoje vou comentar sobre a arte de contar histórias, que remete aos primórdios da humanidade, como forma de entreter ou de transmitir um aprendizado aos outros do clã ou da tribo. Não há como assegurar quem, onde e como da origem específica mas, as culturas mais antigas como as orientais têm a preferência. O hábito de, ao cair da noite, se reunir em volta de uma fogueira e iniciar uma ‘roda de contação de histórias’ está presente em todas as civilizações, com vasto repertório.

Narrar uma história, verídica ou não, exige do contador algumas habilidades tais como o conhecimento de casos, a criatividade e a emoção, afinal os ouvintes têm que se envolver com a história. Dentre tantas, destaco as tradicionais do mundo árabe, como As mil e uma noites contadas por Sherazade (uma jovem esposa do rei Xariar que interrompia a narrativa ao amanhecer e a retomava à noite como forma de adiar sua execução) e as da tradição sufi que transmitiam ensinamentos.

A pesquisadora Nícia de Queiroz Grillo resgatou e publicou uma coletânea (Histórias da Tradição Sufi, da Edições Derviser, 1993) e, vez por outra, a história Os sons do silêncio circula pela internet. Ela versa sobre a ida de um príncipe ao templo para se preparar como pessoa a mando do seu pai. O mestre dá uma tarefa ao rapaz: descrever todos os sons da floresta ao final de um ano. Passado esse tempo, o príncipe retorna e conta sobre o canto dos pássaros, o zumbido das abelhas, o barulho das folhas e do vento. Findo o relato, o mestre o manda de volta à floresta para ouvir mais. Passados dias e noites, o príncipe não distinguiu nada de novo. Mas, em certa manhã, percebeu sons vagos e diferentes dos anteriores, atentou-se mais e mais claros ficaram. Encantado, pensou que seriam os sons aguardados pelo mestre. Pacientemente, continuou a ouvir pois queria a certeza de que estava no caminho certo. Ao retornar ao templo, explicou ao mestre que ouvira os sons do desabrochar das flores, do nascer do sol e da grama sorvendo o orvalho. Então, o mestre sorriu, balançou a cabeça aprovando e proferiu o ensinamento:

“Ouvir o inaudível é ter a calma necessária para se tornar uma grande pessoa. Apenas quando se aprende a ouvir o coração das pessoas, seus sentimentos mudos, seus medos não confessados e suas queixas silenciosas, uma pessoa pode inspirar confiança ao seu redor; entender o que está errado e atender as reais necessidades de cada um. A morte do espírito começa quando as pessoas ouvem apenas as palavras pronunciadas pela boca, sem se atentarem no que vai no interior das pessoas para ouvir os seus sentimentos, desejos e opiniões reais. É preciso, portanto, ouvir o lado inaudível das coisas, o lado não mensurado, mas que tem o seu valor pois é o lado mais importante do ser humano….”

A história é metafórica: a floresta é um símbolo do inconsciente para a psicologia junguiana. A meditação e a respiração pausada possibilitam afastar os barulhos mundanos, aquietar os pensamentos e vivenciar os sons do silêncio. Experimente!!

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